Pós-Modernidade - Jair Ferreira dos Santos

on 15 setembro, 2010



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Pós-Modernidade (O Pós Contém um Des)


Pós-Modernismo é o nome aplicado às mudanças ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950, quando, por convenção, se encerra o modernismo (1900-1950). Ele nasce com a arquitetura e a computação nos anos 50. Toma corpo com a Pop Art nos anos 60. Cresce ao entrar na filosofia, durante os anos 70, como crítica da cultura ocidental. E amadurece hoje, alastrando-se na moda, no cinema, na música e no cotidiano programado pela tecnociência (ciência + tecnologia invadindo o cotidiano com desde alimentos processados até microcomputadores), sem que ninguém saiba se é decadência ou renascimento cultural. Assim, tecnociência, consumo personalizado, arte e filosofia em torno de um homem emergente ou decadente são os campos onde o fantasma pós-moderno pode ser supreendido. O Pós-Modernismo é coisa típica das sociedades pós-industriais baseadas na informação.

Aqui vão palavras que são verdadeiras senhas para invocar o fantasma pós-moderno: chip, saturação, sedução, niilismo, simulacro, hiper-real, digital desreferencialização, etc. Dificilmente elas serviriam para descrever o mundo de 30 ou 40 anos atrás, o mundo moderno, quando se falava em energia, máquina, produção, proletariado, revolução, sentido, autenticidade. Mas se a pós-modernidade significa mudanças com relação à modernidade, o fato é que não se pode dispensar o aço, a fábrica, o automóvel, a arquitetura funcional, a luz elétrica – conquistas associadas ao Modernismo. Assim, no fundo, o Pós-Modernismo é um fantasma que passeia por castelos modernos.

Mas as relações entre os dois são ambíguas. Há mais diferenças que semelhanças, menos prolongamentos que rupturas. O individualismo atual nasceu com o Modernismo, mas seu exagero narcisista é um acréscimo pós moderno. Um, filho da civilização industrial, mobilizava massas para a luta política; o outro, florescente na sociedade pós-industrial, dedica-se às minorias – sexuais, raciais, culturais -, atuando na micrologia do cotidiano.

Por ora, contentemo-nos com saber que o pós contém um dês – um princípio esvaziador, diluidor. O Pós-Modernismo desenche, desfaz princípios, regras, valores, práticas, realidades. A des-referencialização do real e da des-substancialização do sujeito, motivadas pela saturação do cotidiano pelos signos, foram os primeiros exemplos. Muitos outros virão. Entendamos ainda que o Pós-Modernismo é um ecletismo, isto é, mistura várias tendências e estilos sob o mesmo nome. Ele não tem unidade; é aberto, plural e muda de aspecto se passamos da tecnociência para as artes plásticas, da sociedade para a filosofia. Inacabado, sem definição precisa, eis por que as melhores cabeças estão se batendo para saber se a "condição pós-moderna" - mescla de purpurina com circuito integrado - é decadência fatal ou renascimento hesitante, agonia ou êxtase. Ambiente? Estilo? Modismo? Charme? Para dor dos corações dogmáticos, o pós-modernismo por enquanto flutua no indecidível.

Vejamos o que significa o ambiente pós-moderno. “Que criança linda” - disse a amiga à mãe da garota. - “Isto é porque você não viu a fotografia dela a cores” - respondeu a mãe! Cínica, a piada contém a essência da pós-modernidade: preferimos a imagem ao objeto, a cópia ao original, o simulacro (a reprodução técnica) ao real. E por quê? Porque desde a perspectiva renascentista até a televisão, que pega o fato ao vivo, a cultura ocidental foi uma corrida em busca do simulacro perfeito da realidade. Simular por imagens como na TV, que dá o mundo acontecendo, significa apagar a diferença entre real e imaginário, ser e aparência. Fica apenas o simulacro passando por real. Mas o simulacro, tal qual a fotografia a cores, embeleza, intensifica o real. Ele fabrica um hiper-real, espetacular, um real mais real e mais interessante que a própria realidade.

O ambiente pós-moderno significa basicamente isso: entre nós e o mundo estão os meios tecnológicos de comunicação, ou seja, de simulação. Eles não nos informam sobre o mundo; eles o refazem à sua maneira, hiper-realizam o mundo, transformando-o num espetáculo. Uma reportagem em cores sobre os retirantes do Nordeste deve primeiro nos seduzir e fascinar para depois nos indignar. Caso contrário, mudamos de canal. Não reagimos fora do espetáculo.
(Jair Ferreira dos Santos. O Que é Pós-Moderno. Editora Brasiliense. São Paulo, 2002)

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